DEC.LEI Nº344/97

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Escrever é poder amar-te



domingo, 2 de março de 2008

O AMOLADOR

Ouço-o lá fora. Mas não ouço a chuva ou os pingos no varandim a estalarem naquele som de metal que faz música. Agora deu-me um frio repentino, uma sensação de noite que me encolhe entre cobertas e roçar a face no algodão macio da almofada é tão mais confortável que estar lá fora. Daqui a pouco vai chover que já ouvi o amolador e embora não lhe chame os serviços ou vá a correr à janela vê-lo passar, sei-o de lado amparado na bicicleta ferrugenta, mãos no guiador, de quando em vez leva o apito espalmado aos beiços e sopra longo e depois rápido. Cheira-me a desgraça sei lá porquê, a tragédia que não conseguirei evitar se não me levantar depressa desta cama e o enxotar para longe da minha varanda e das minhas janelas, receio que as begónias murchem naquele sonoro prenúncio de fatalidade. Calou-se. Já chove? Onde será que rola o amolador, sem cama onde se abrigar nem varandas nem janelas com begónias vermelhas onde possa espreitar fregueses que o chamam de tesouras e facas, um golpe só e queda-se o apito longo e rápido do amolador. Ouço uma moeda que caiu ao chão. Aconchego-me. O amolador há-de voltar, triste, assobiado como um vento numa casa abandonada. Por agora chove, ouço o varandim a chamar a chuva, os pedais da bicicleta partem rápido, adeus amolador.

3 comentários:

marisa disse...

fizeste-me lembrar a minha infância em viseu, quando na rua onde nasci e cresci - a rua do arco (com uma fonte à entrada imortalizada no filme de manuel de oliveira: amor de perdição), passava o amolador. recordo perfeitamente o som que a gaita de beiços de tubinhos de plástico fazia, devem ter um nome, mas não me recordo agora; era um som agudo ascendente e descendente. gostava de me lembrar se também se dizia lá por casa que ele traria chuva...
cheguei a esta tua casa e vou ficar visita assídua. aqui as palavras também me enchem.
um beijo
marisa

Rui Caetano disse...

Um texto muito bem escrito e uma história interessante. Gostei do amolador.

poetaeusou . . . disse...

*
o amolador, na minha zona,
� prenuncio de mau tempo
hoje ouvi um, e como um aut�mato,
exclamei:
vamos ter sudoeste . . .
,
conchinhas
,
*