DEC.LEI Nº344/97

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Escrever é poder amar-te



quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

DEZEMBRO OUTRA VEZ

Hoje como nos outros anos façamos a alegria, rio da mesmo forma como era criança e o pinheiro é tão verde como sempre foi, traz os enfeites e os teus trejeitos, as tuas memórias de histórias passadas de outros Natais, eu lembro tudo e faço de conta que é surpresa de novo só para te ouvir, que importa se a estrela já não tem pontas e o brilho das fitas se embaciou na partida dos queridos, hoje como dantes trazemos todos, recordamos festas e odores, presentes oferecidos e mãos aquecidas no aconchego do amor, Dezembro no peito a iluminar, conta outra vez.

 

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

SEM HISTÓRIA

Reencontrei-te num severo dia sombrio sem sol nem chuva, nem frio ou calor que me lembrem para marcar que aquele foi o dia em que voltei a ver-te. Falámos de generalidades evitando falarmos de nós, procurámos sítios de multidão para não estamos sós nem que as mãos habituadas a darem-se se esgueirassem de novo para os nós dos dedos, falámos a olhar a paisagem que não recordo porque não devía ter cor e se a havia foi-se naquele dia em que nos reencontrámos. Porque tudo o que dissemos foram palavras soltas perdidas de livros lidos por outros, de nós nada restou como história de amor.
 
 

terça-feira, 28 de outubro de 2014

A CAIXINHA

De vez em quando abría a caixinha, revisitava os achados colhidos desde toda a vida, passava-lhe os dedos, demorava-se por objectos miúdos ou relía pedaços de papel muito finos. O tempo passava e ela dobrada sobre a caixinha, embevecida, um bocado de tempo só seu que os outros se haviam habituado a respeitar, comentavam ela e a sua caixinha, coisas de pessoa velha e tonta que se havia tomado de afectos a uma caixa de cartolina deformada por nada ter de fazer. Ela já havia mostrado o seu tesouro aos demais mas não sendo dinheiro ou jóias ou outro tanto de valor, a caixinha havia sido desprezada e sem incómodos, ficava à vista de toda a gente sem precisão de resguardo. Quando ela se foi, andou aos tombos e foi parar às mãos de um homem que curioso veio a dedicar-se a descobrir todas as pequenas coisas que a defunta havia recolhido pela vida. Chamou os outros e contou-lhes a história da família. 
 
 

domingo, 14 de setembro de 2014

O MONSTRO [DA IMAGINAÇÃO]

Sentou-se no muro e bateu com os calcanhares, o Sol descia devagarinho lambendo as cores do dia e arrastando numa aguada os contornos da outra margem, em breve o outro lado haveria de parecer uma mancha escura como um monstro deitado, depois muitos pontinhos brilhantes surgiríam e essa forma de medo traría a imaginação de uma cidade encantada como um dia de Natal. Bateu com os calcanhares espantando o escuro que veio embrulhá-lo, atirou uma pedra ao vazio e não ouviu som. Talvez que o dia acabado engolisse o outro pedaço de terra e só no dia seguinte ele voltasse a aparecer e tudo o que a sua vista alcançava eram estórias para entreter a barriga até a Mãe o chamar para o jantar. Levou os dedos à boca e soltou um assobio. Nada. Só o chamado para a mesa. Ergueu-se do muro e caminhou em direcção a casa mas ouviu difuso um silvo a responder-lhe. Correu, correu muito.
 
 

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

A ÁGUA DEBAIXO DA PONTE NUNCA É A MESMA

E quando se acabarem estas perguntou ele, voltarás às de inicio se o tempo ladrão não te roubou a lembrança ou das de começo farás uso das palavras já conhecidas reinventando outros contares e fazendo novas narrativas? Ela olhou-o tranquila, decerto me hás-de ajudar se a repetição vier, não quero contar coisa usada mas outros seremos nós dois, tu a escutares no sorrir de recordar a primeira vez e eu esforçada por trazer novidade ao que do tempo as palavras me ensinaram.

 

domingo, 20 de julho de 2014

UM MILHÃO DE ESTRANHOS

Do papel fez embrulho para presentes dar. Fez dobras e vincos para num barco se encaixarem as águas de um rio. Fez outras dobras e outros vincos para do sol se esconder e à cabeça levar um chapéu que faz rir. Fez um plano branco e nele cuspiu cores de ofertas, de mares e de céus e depois achou que ali se aquecia, embrulhada em estórias do que já sentira e então rasgou num milhão de pedacinhos o papel que a tantos usos dera e simplesmente escreveu era uma vez. E foi entregando a um milhão de estranhos que por ela foram passando e à medida que os estranhos lhe perguntavam o que era aquilo ela contava-lhes uma história.

sábado, 5 de julho de 2014

NAVEGANTE [SOMOS]

 
Quando te olho no soslaio do horizonte entre linhas da memória, vem-me à boca o sal da descoberta doutros séculos de aventura, nem mesmo a força dos braços apartados entre saudades, outros abraços escritos entre cartas assobiados ou fados lembrados à noite entre pardos candeeiros e pães desmiolados a contarem naus catrinetas de livros esfarrapados entre cartilhas de Deus me dizem tanto do que és quanto do mar quando vem e de manso, alaga o peito, na onda traz a vontade da partida para de novo o regresso escreveres.

domingo, 1 de junho de 2014

POETAS

Não brinques com a poesia, há versos que matam só de os pensarmos mesmo sem haver rima. Vê os poetas, são uma raça, triste daquele que assim seja mesmo que não o saiba, porque já nasce condenado. Ser poeta é vir ao mundo diferente, não há feitiço que o mude pois é outro sangue que lhe anima a vida. Não brinques com a poesia, há versos que dizem amor.

sábado, 17 de maio de 2014

AS MÃOS (À ESPERA)

Que interessa? Éramos nós ou nem isso, talvez fôssemos apenas as mãos à espera, mãos pousadas sobre pernas que já tinham caminhado muito, muito e agora plano de mãos, sim de mãos que se davam uma à outra para lembrar como era quando se encaixavam  nas alheias, a esquerda à direita de um par perfeito, um outro que não era seu e até nisso o mundo achara caminhos feitos de pernas cansadas para encontrar mãos certas para se atarem na justa medida, francas e seguras, mãos sinceras.
Sobram os riscos nas mãos, uma espécie de lembrança dos vincos que ficaram no aperto das mãos dadas, sabedorias das mãos sinceras ou olhos que passaram imagens para as minhas palmas, assim não esqueço, assim nada mais interessa, éramos nós, ainda o somos.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

O CORPO (AUSENTE)

Lembra tudo como se fora presente, ausente dele é a mancha afundada ao lado e nem cheiro agora permanece para uma réstia se perseguir de olhos fechados até ao lugar vago, mão que afaga vagarosa igual ao carinho dos tempos e ao hábito do nome pelas manhãs e pelas noites, ainda o diz silenciosa, ainda o diz a ecoar pelo quarto para as paredes não o esquecerem vincadas pelo encosto dos ombros e das palmas e de tudo o que de vida há impresso como papel a forrar anos, faz-de-conta que está para esquecer o faz-de-conta ausente, lembra tudo como agora e já nem sabe o que custa mais, se a lembrança dela se a ausência dele sem ela.

domingo, 2 de março de 2014

O CORPO (POR CIMA)

O corpo por cima encaixado, moldes numa adição de uma conta feita em subtracção, partes de dois que não se somam nas cartas de navegar de um mar encrespado, há um navio queimado que não importa ser salvo, atirem-se tábuas ou bóias, icem-se velas ou mude-se o rumo, o que interessa é chegar a terra firme, o corpo por cima do corpo, dois separados a seguir viagem que a paisagem é a mesma de sempre no mar, para quê conversas sobre marés ou estórias sobre constelações se o astrolábio e o sextante são tão velhos quanto os dragões, monstros marinhos e outras invenções como o amor.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O CORPO (AO LADO)

O corpo ao lado é só um corpo, não passou muito tempo em que fora agasalho de corpo e de coração, para onde foram esses aqueceres no abismo de momentos que passaram tão rápido, a distância que mede o esticar de um braço são os minutos entre amar e o estar, quando se tornaram dois em vez de um, o corpo ao lado que faz peso sobre a cama onde se amaram no espaço de um, limites de respirar em silêncio ou gargalhadas no escuro a alumiar caminhos, o corpo estranho ao lado, quanto tempo passou para se ser um corpo ao lado e as fronteiras montadas entre corpo e corpo racharam territórios até esfriarem o coração.

domingo, 19 de janeiro de 2014

RESTOS

Pensar-se que das letras daqui se secam as estórias é o mesmo que abeirar-se do Rio e lhe encontrar uma cova funda e seca, nunca tal em vida minha se vai achar que do meu fundo há tanta água quanta a que o leito das duas margens leva e traz. Depois de fria e estendida bem podem achar o que entenderem, mas é quase certo que se a vontade minha for adiante, pouco encontrarão em que nadar que o desígnio que lhe dou é a secura ou a queima lançando restos oferecidos ao meu Rio, amante de todos os dias.